2022.3 - O Apocalipse dos Trabalhadores - Valter Hugo Mãe
O Apocalipse dos Trabalhadores... de Valter Hugo Mãe
Livro que retrata a vida, aparentemente simples, das poucas, mas suficientes, personagens que encontramos neste livro, mais precisamente ...
Maria da Graça, mulher a dias;
Quitéria, que também faz o mesmo que a sua amiga Maria da Graça, embora também seja uma carpideira "profissional";
Sr. Ferreira, senhor com alguma idade, abastado, patrão de Maria da Graça...e entre os quais as coisas podem complicar-se e tornarem-se muito sérias!
Augusto, marido da Maria da Graça, passa grandes temporadas a trabalhar no estrangeiro; Contudo, são nesses momentos de ausência, que Maria da Graça sente-se livre, pronta para enfrentar a vida de outra forma.
Andriy, emigrante dos países de Leste, a viver e a trabalhar em Portugal em busca de novas oportunidades, para tentar construir uma vida com maior estabilidade e ainda assim tentar ajudar os pais que deixou na Ucrânia, tentar proporcionar-lhes um futuro melhor [isso ainda antes da guerra actual....parecia que já se previa]; Aqui no livro é uma espécie de namorado de Quitéria.
Conforme o título do livro sugere, o trabalho/emprego das personagens é um dos temas centrais do livro, que explora aqui um pouco as profissões mal remuneradas que elas (Maria da Graça e Quitéria) nesse caso exercem, mas que são a sua única forma de poderem ter o seu sustento, de poderem ir fazendo a sua vida conforme podem e, eventualmente ou previsivelmente, sem grandes regalias.
Entretanto, e como se esse tema fosse colocado em segundo plano, o autor explora outro tema que está relacionado com o primeiro, e que tem que ver com as relações interpessoais das personagens supra referidas, e é aí que as coisas se tornam "mais sérias" mesmo com o toque de humor com o qual o autor retrata certas situações ou acontecimentos. É aí que aquelas vidas, aparentemente descomplicadas, e que pensamos que se cingem somente àquelas funções, àquelas rotinas, àquele existir, afinal revelam uma espécie de complexidade, um emaranhado de aparentes insignificâncias, que está associada a uma busca de razões para, não só para existir, mas também para viver, uma busca de um sentido e um significado ou propósito para as suas vidas, junto de quem lhes parece ser a pessoa certa, levando-nos para outro tópico nuclear, ou seja o amor, o amor por si próprios e o amor pelos outros.
No livro, para além de algumas referências a situações ou características típicas de outros países, notam-se sobretudo algumas referências às ideias predefinidas de alguns aspectos do nosso povo português, da nossa sociedade, da nossa suposta cultura e costumes. Aspectos esses nem sempre tratados da forma mais agradável e que podem ser uma espécie de bofetada para alguns leitores, já que talvez isso tenha sido uma forma do autor fazer o leitor ter consciência de que algumas das suas ideias não passam de ideias preconcebidas, fazendo-o pensar que até pode ser que ele [leitor] nem tenha sequer uma ideia própria, e o seu conhecimento, ou aquilo que ele pensa que sabe, é apenas o resultado daquilo que ele ouviu dizer, sem questionar, sem duvidar.
O livro no seu geral transmite-nos uma ideia de balanço perfeito, sobretudo para quem gosta da forma sublime como o autor consegue exprimir-se, e dotar de sentimento as palavras e acontecimentos que, podendo ser banais, deixam de o ser, e ganham uma dimensão imensa. As personagens quase que acabam por ser alguém que podemos conhecer da vizinhança ou da comunidade ou até da família.
Enfim, trata-se portanto de mais um excelente livro de Valter Hugo Mãe!
Uma história aparentemente simples, mas que explora um dos temas, ou sentimentos, mais complexos inerentes ao Ser Humano... O Amor.
Aqui explorado de forma um pouco peculiar, mas que, ao mesmo tempo, não deixa de retratar aspectos tão típicos e tradicionais do nosso povo português, em que, por vezes, parece que estamos perante personagens tipo caricatura, estereotipadas. Contudo, e não querendo parecer repetitivo, isso não faz delas personagens monótonas ou vazias de personalidade ou sentido, antes pelo contrário. Faz - nos aproximar delas, sentir que as conhecemos, mesmo que seja aquele conhecer quase "de vista".
"achava que maria da graça era mulher sem desejos de tipo algum. andava pela vida a pensar no trabalho e trabalhava e não acontecia mais nada, porque não era mulher para lhe acontecer mais nada."
"haveria de ter a quitéria as vezes que quisesse, mas nunca permitir que isso o demovesse da progressiva metalização do corpo. via-se como platinado, robótico, uma força incrível e os sentidos alerta como seria impossível para uma cabeça só orgânica."
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