2021.3 - A minha avó pede desculpa - Fredrik Backman

 


Aproveitando a deixa do dia dos avós, que, como sabemos, e à semelhança de tantos outros dias que têm o seu destaque no calendário, não deixa de o ser todos os dias, deixo aqui algumas palavras no seguimento da leitura do livro "Minha avó pede desculpa" de Fredrik Backman (autor mais conhecido pelo livro "Um homem chamado Ove") terminada, por acaso, naquele dia (o tal dia dos avós).

Assim, e falando de avós, posso dizer que Felizes, e Sortudos, são aqueles que se "podem dar ao luxo" de ter oportunidade de conviver,  e por conseguinte conhecer, seus avós, sobretudo se esta oportunidade se estender ao longo do tempo, permitindo que essa convivência seja vivida [até] em idade que lhes permita tirar melhor proveito dessa partilha intergeracional, e de tuo o que possa advir dessa experiência, já que, quer queiramos quer não, até determinada idade (talvez até aos 4/5 anos), as memórias que os netos de tenra idade possam guardar dos seus avós, e daquilo que eles lhes possam tentar transmitir, acabam por ser escassas, ou ligeiramente abstractas. Isso não invalida obviamente que o façam, pois todo o tipo de educação que possa ser transmitida, desde cedo, terá certamente o seu devido valor e são sementes que podem posteriormente dar os seus frutos.

Os meus partiram cedo, alguns deles antes de eu sequer nascer, e os que conheci, não conheci tão bem quanto gostaria. Por isso, admiro quando as pessoas demonstram admiração por seus avós, não sendo invulgar eles, avós, fazerem parte das pessoas de referência para essas pessoas, sendo, regra geral, descritos como sinónimo de exemplos a seguir, e como fonte de conhecimento e de bons ensinamentos, por norma resultado de vidas repletas de experiências (trabalho) e sabedoria, mesmo que, muita dela, seja proveniente de um senso comum, nesse caso bastante apurado.

É escusado fazer aqui grande referência ao "assunto do último ano e quase meio", AKA Covid, pois embora este esteja intrinsecamente relacionado com o tópico destas palavras, na medida em que afecta sobremaneira a relação dos avós com os netos e vice-versa, estendendo-se, logicamente, aos restantes elementos da família, é um assunto que já se torna um quase dispensável por motivos de saturação. Assim, e regressando ao assunto do livro referido anteriormente, a sinopse do referido livro é a seguinte :

 Elsa tem sete anos de idade, quase oito, e é diferente. Para já, tem como melhor – e única – amiga a avó de setenta e sete anos de idade, que é doida: não levemente taralhoca, mas doida varrida a sério, capaz de se pôr à varanda a tentar atingir pessoas que querem falar sobre Jesus com uma arma de paintball, ou assaltar um jardim zoológico porque a neta está triste. Todas as noites, Elsa refugia-se nas histórias da Avozinha, cujo cenário é o reino de Miamas, na Terra-de-Quase-Acordar, um reino mágico onde o normal é ser diferente.

Quando a Avozinha morre de repente e deixa uma série de cartas a pedir desculpa às pessoas que prejudicou, tem início a maior aventura de Elsa. As cartas levam-na a descobrir o que se esconde por detrás das vidas de cada um dos estranhíssimos moradores de um prédio muito especial, mas também à verdade sobre contos de fadas, reinos encantados e a forma como as escolhas do passado de uma mulher ímpar criam raízes no futuro dos que a conheceram. A minha avó pede desculpa é uma belíssima história, contada com o mesmo sentido de humor e a mesma emoção que o romance de estreia de Fredrik Backman, o bestseller internacional Um homem chamado Ove.


 Fazendo referência ao que consta na sinopse, é verdade que este livro consegue ser tão divertido como o livro do "Ove" e, embora este seja o segundo livro de Backman que leio, é difícil não nos apercebermos de algumas características que devem fazer parte das escrito do autor, e aqui essas estão presentes nas semelhanças entre ambos os livros, nomeadamente na exploração das relações entre as pessoas, não só as relações familiares, mas sobretudo as relações entre pessoas que partilham espaços comuns. No caso deste livro, é o prédio (condomínio) onde residem.

Talvez o "estranhíssimos moradores" estejam ligeiramente, só ligeiramente, exagerado, pois no fim de contas se calhar são apenas um pouco estranhas, mas ainda assim muito interessantes e curiosas de se conhecer ao longo do livro e das histórias que vão sendo reveladas no seguimento das cartas que a personagem principal, Elsa, tem de entregar conforme era o desejo da sua falecida avó.

 

Confesso que a parte dos contos de fadas, e os reinos imaginários, não foi do que me cativou no livro, embora as coisas depois acabem por fazer sentido, e afinal o mundo imaginário não é assim tão imaginário e pode simplesmente estar somente disfarçado diante dos nossos olhos e foi a forma que a avó encontrou de preparar a neta para as coisas que ela haveria de descobrir.

 

Acompanhar Elsa, e as peripécias dela com a avó, e restantes personagens, ao longo do livro acaba por ser uma espécie de aventura, uma diversão.  

 

Não querendo deixar "spoilers" para quem possa ter interesse na leitura deste livro, deixo aqui algumas passagens do livro. Algumas delas cómicas, outras nem tanto.

 

"Ouve uma respiração ofegante do outro lado do pátio e vira-se. George vem a correr na direção do prédio. Sabe que é George porque ele usa os calções por cima das calças de jogging e tem o casaco mais verde do mundo. George não vê nem Elsa nem o wurse porque parou e está a saltar para cima e para baixo de um banco. George treina muito a correr e a saltar para cima e para baixo de coisas. Por vezes, Elsa pensa que ele vive numa audição permanente para participar no próximo jogo do Super Mário."

 

"Não que ela grite ou interrompa; simplesmente, não é o tipo de pessoa que os outros queiram contrariar. A Mamã gosta desse estado de coisas porque o conflito é mau para a eficiência e a eficiência é muito importante para ela. Às vezes George comenta, a brincar, que a Mamã dará à luz o Meiinho na hora de almoço, para evitar efeitos negativos na eficiência geral do hospital."

 

NOTA: O Meiinho é o "nome" dado ao bebé que está na barriga da mãe de Elsa.

 

"Certa vez, Elsa ouviu um dos médicos no hospital da Mamã declarar que a Avozinha «conseguiria armar discussão numa sala vazia»"

 

"No seu sexto aniversário, a Avozinha contou-lhe a história do anjo-do-mar. Para lhe ensinar que nem todos os monstros começam por ser monstros, e que nem todos os monstros se parecem com monstros. Alguns trazem a sua monstruosidade por dentro."

 

"As catástrofes improváveis trazem ao de cima coisas improváveis nas pessoas. Sofrimento improvável e heroísmo improvável."

 

"Elsa lembra-se de a Avozinha comentar que «as melhores histórias nunca são nem completamente realistas nem totalmente inventadas»"

 

"O Papá pigarreia. Faz aquele ar que os pais fazem quando lhes ocorre que algo que costumavam fazer porque era importante para as filhas se transformou agora numa daquelas coisas que as filhas fazem porque é importante para os pais. É uma linha divisória muito fina. Nem os pais nem as filhas se esquecem de quando a cruzam."

 

"Porque temos de nos importar com alguma coisa, Elsa. Assim que alguém se importava com alguma coisa neste mundo, a tua avó achava que isso era ser «chato», mas se uma pessoa não se importar com nada, não vive. Só existe."

 

"Quando acontece alguma coisa terrível no mundo real, as pessoas dizem sempre que a tristeza, a perda e o sofrimento do coração «diminuirão com o tempo», mas tal não é verdade. A tristeza e a perda são constantes; se tivéssemos de as carregar ao longo de toda a vida, não conseguiríamos aguentar. A tristeza deixar-nos-ia paralisados. Assim, no fim, guardamo-la em sacos e procuramos um sítio onde a deixar."

 

"O Papá dança espetacularmente mal; parece um urso muito grande que acabou de acordar e tem os pés dormentes. Elsa tem saudades disso."

 

"A Avozinha não tinha paciência para ler livros, por isso Elsa costumava ler para ela enquanto andavam em Renault, porque Elsa queria ter alguém com quem falar sobre os livros depois de os ler. Sobretudo Um Conto de Natal, que Elsa lhe lera várias vezes porque a Avozinha gostava de histórias de Natal.

Assim, quando a Mamã disse aquilo de a Avozinha não poder andar nua pela casa por uma questão de respeito a George, a Avozinha, ainda nua, virou-se para ele e berrou: «Que disparate é esse de respeito? Tu vives com a minha filha, por amor de Deus!» E, em seguida, fez uma vénia profunda e desnudada e acrescentou, em tom cerimonioso: «Eu sou o fantasma dos Natais futuros, George!"

 

"Porque toda a gente gosta de George. É o superpoder dele.

E sabe que, se gostar dele, vai ficar muito desapontada quando o Meiinho nascer e George se esquecer dela. Portanto, mais vale nem sequer começar. Se não gostarmos das pessoas, elas não podem magoar-nos. As crianças de quase oito anos que são muitas vezes descritas como «diferentes» aprendem-no bastante cedo."

 

"Ele às vezes faz isso. Desaparece. Não fiques preocupada. Ele… tem medo das pessoas. Desaparece durante uns tempos. Mas volta sempre. Só precisa de tempo.

 – Acho que ele precisa de ajuda.

 – É difícil ajudar quem não se quer ajudar a si próprio."

                                              

 

 

Comentários

Mensagens populares deste blogue

2024.3 - A passadeira

2024.1 - Solidão

17.6 - a never ending life