da Noite, o Dia!


Inúmeras vezes me questiono acerca desse vosso vaguear nocturno pelas ruas de uma vila vazia, muitas vezes fria, silenciosamente adormecida na noite e num sono esporadicamente interrompido pelo barulho de alguma viatura que circula vindo de algures e dirigindo-se para qualquer sítio. Talvez vocês dois façam da noite o vosso dia e essa parece-me uma suposição relativamente fácil de se fazer e tudo o resto permanece, pelo menos para mim, como uma espécie de mistério. O desconhecido é para nós como um mistério. 
Talvez eu esteja a criar ideias que incidem sobre algo normal. Algo normal como sair à noite. E se calhar estou a fazer isso algo mais estranho ou incomum do que realmente o é.
Não conheço o vosso passado, nem tão pouco o vosso presente ou futuro, mas não consigo deixar de me questionar acerca dessa vossa opção de abandonar os vossos lares e vir andar sem destino pelas ruas desta vila. Sei que a noite consegue ser mágica e despertar em nós sentimentos que durante o dia estão entranhados em nós e não sabem como florescer. Chega a noite e cada um de vós sai da sua casa e começa a sua lida nocturna. Muitas vezes acabam por se encontrar e partilham essa vossa caminhada, esse vosso passeio. Nos vossos lares devem deixar apenas o silêncio à espera do vosso regresso.
Se existissem vampiros fora dos filmes, séries e livros, podia acreditar que vocês fizessem parte deles e a julgar pelas vossas idades, idades de uma longa vida, podiam muito bem ser os chefes da quadrilha. Mas como humanos que são, e como pessoas com uma idade cujos anos estão à vista de quem vos vê, não é difícil ver que atrás de vós está um longo percurso e essa é também uma das razões que de certa forma aguça a minha curiosidade. Por vezes há uma vontade de vos abordar e trocar algumas (ou muitas) palavras, certamente muitas questões para as quais gostaria de obter respostas.
Quem são vocês? Sempre viveram aqui nesta vila? Onde estão as vossas famílias? Porque vivem sozinhos? Porque é que optam por sair quase exclusivamente à noite?
A ele, perguntaria porque razão ele parece estar constantemente à procura de algo nas ruas da vila e faria essa questão porque é costume vê-lo explorar com o olhar cada centímetro quadrado do chão. Obviamente que isso dá origem a mais questões. Será que ele perdeu alguma e agora não dá descanso à sua alma até a conseguir achar? O que é que ele pensar conseguir encontrar no escuro dessas ruas nocturnas? Há quanto tempo dedicas as noites da tua vida a essa busca que, mesmo em noites frias e de chuva, não parece haver descanso?
A ela, perguntaria porque razão ela opta por viver sozinha numa casa degradada que, a julgar pelo exterior, não possui condições mínimas para ser habitada. Será que na impossibilidade de conseguires adormecer na escuridão da tua casa, optas por vir para a rua onde as luzes dos candeeiros de rua e das montras de algumas lojas, fazem-te companhia ao longo do teu passeio que se calhar tem como função cansar o teu corpo para quando chegares a casa novamente, não repares na escuridão que te envolve e assim adormeceres ao longo das restantes horas que faltam para nascer um novo dia? 


Por norma não abordo pessoas que não conheço com questões, sobretudo com questões pessoais e cujas respostas possivelmente iriam criar a necessidade de revisitar memórias e passados que se calhar querem permanecer cobertos de pó e no esquecimento.
Será que outras pessoas, com dúvidas semelhantes às minhas, já vos abordaram? Não sei se sim ou se não. Uma coisa é certa, continuo a vê-los nessa vossa estranha rotina e até arranjar coragem para vos abordar, acredito que tudo se mantenha mais ou menos na mesma e sei que lamentarei o dia em que deixar de vos ver à noite por estas ruas. Talvez necessitem de algum tipo de ajuda e nem sequer vos questionei acerca disso. O que me afasta um pouco desse ultimo desassossego é o facto de saber que por vezes conversam com pessoas que supostamente conhecem e que acredito que estão mais aptas para prestarem algum tipo de ajuda.


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