Wish you well

Estás aqui connosco, e talvez por não te estar a acompanhar pessoalmente nesse processo de "fazer as malas" para a grande viajem, sinto o tempo passar depressa demais, em que apesar de ainda estares entre nós, já sinto um vazio. Um vazio que se estende cada vez que te vejo desvanecer em imagens que te escondem em formas que nos atingem como se fossem um gesto de despedida. 
O tempo que passou, entre o dia em que tiveste a infelicidade de ganhar o bilhete para essa viajem [todos nós temos um bilhete reservado com o nosso nome guardado dentro dessa enorme tômbola que não pára de girar, um dia será a nossa vez de ganhar a viagem], e o dia de hoje, em que, na mais profunda tristeza ouço os teus passos afastarem-se lentamente e ao mesmo tempo de forma fugaz, passou com a rapidez com que uma chama devora um fósforo. Cada dia que passa sinto em mim uma espécie de cobardia, uma espécie de vergonha, que se devem ao pensamento que pesa em mim como se fosse uma culpa, uma culpa que brota do facto de talvez não ter feito o que devia, que era estar presente, oferecer alguma ajuda [mesmo que não saiba que tipo de ajuda pudesse ser], talvez apenas dizer-te que não foste só mais uma pessoa e que apesar de não nos conhecermos muito bem, há laços que existem mesmo antes de termos consciência disso, e que nas poucas vezes que pudemos partilhar momentos da nossa vida, sobretudo a partir da altura em que já temos uma melhor noção da realidade [quando crescemos], fomo-nos aproximando. Em mim, criou-se um registo que está guardado, gravado. Nesse registo não ligo ao defeitos;  pois até nem sei quais o que te poderia atribuir e além disso todos nós estamos repletos deles, pois afinal de contas somos o que somos não só devido às virtudes, mas também aos devido ao nossos defeitos; simplesmente guardo a tua imagem, e nela, ficam os momentos que partilhamos ao longo dos anos.
Se lesses ou leres essas palavras, gostava que elas significassem para ti, o meu pedido de desculpa pela minha ausência. 
Há situações na nossa vida em que não sabemos qual a atitude correcta, se devemos ser apenas espectadores ou se devemos fazer parte do elenco de actores participantes na peça da vida. Quanto muito, talvez já não fosse mau fazer de figurino... ou será que estar no palco só para preencher um espaço é tão vago como ser um espectador?! Apesar de estar a comparar, sei que cada um tem a sua importância, é tudo uma questão de saber escolher a função a desempenhar mediante o guião.

Deixo esta música aqui porque parte dela diz exactamente aquilo que este texto pretende dizer. Creio que já fiz referência a esta música aqui no blog anteriormente, por isso...desculpem a repetição se for o caso.


Wish You Well - Katie Herzig

Comentários

  1. Olá

    Muito bom, como sempre. Fizeste-me lembrar, aqui e ali, o "Alexis" de Marguerite Yourcenar, essa carta que termina "peço desculpa, nao por partir, mas por ter ficado tanto tempo"...

    Um enorme abraço

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  2. Qualquer semelhança é coincidência, pois não conheço "Alexis" e por acaso nunca li nada de Marguerite Yourcenar. Já agora devo dizer que depois irei ver do que se trata :).

    Abraço

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  3. ... o que me trouxe aqui, foi o título do teu espaço, quando visitava 'Lobinho', amigo virtual comum! Mas fiquei e li, atentamente, sem pressas!

    Não vou acrescentar nada, nem tão pouco comentar um texto que me soa a tanta intimidade! E a intimidade de cada um venera-se...

    (gostei do tema que ilustra em paisagem musical a ternura da tua)

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  4. Com esta é que me lixaste!....

    Com a música!

    A escrita está óptima....e não te sabendo de todo, fico feliz por saber que sentes e reconheces isso tudo!

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  5. ... vim para ler outros 'fragmentos', mas vi que estás como eu... afastado!

    Ou apenas terminaste, depois de escrever o que sentias que tinha ainda a dizer...

    Reli, fiquei a ouvir Katie Herzig.

    I wish you well...
    Um beijo,
    (suponho que a tua imagem é de Saint Exupéry, linda!)

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